JC Bridon
Podem me impedir de escrever mas, de pensar, jamais!
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Textos

O HOMEM, O TEMPO E A VIDA

“O HOMEM, O TEMPO E A VIDA"

 

O homem entra, pára

e começa a observar.

 

O quadro na parede

a criança sem expressão

seja de alegria, tristeza

ou outra qualquer.

 

O ancião sentado

olhar incerto

num incerto futuro

e um certo passado

passados a tanto tempo.

 

O quadro azul

cor da paz

da canção

do amor

e dos sonhos.

 

O homem olha

ora um

ora outro

novamente observa

o quadro

o ancião

o quarto.

 

“É a vida”, pensa.

é o passado esquecido,

o presente sempre presente

com sua força estranha

demonstrando ao mesmo tempo

pujança e decadência

de uma vida que está prestes a desaparecer

como num piscar de olhos.

 

Observa o quarto azul

“parece o céu”, pensa novamente

se assemelha pela paz que emana

e pela harmonia das cores

que enchem seus olhos de lágrimas.

 

“O que conquistei?”, começa ele

“O que consegui?”, pensa pensativo

desde que do quadro saí

para caminhar nesta vida sem rumo certo?

 

Meus anseios foram conquistados

ou me deixei enganar

pelos enganos humanos

sempre presentes em minha volta?

 

Olha o quadro

volta no tempo

e se vê chorando

o choro mimado

de um garoto tristonho.

 

“Parece que sofre”.

tenta buscar lá atrás

alguma recordação da infância

que lhe dirá com certeza

a razão daquela expressão.

 

“Só criança”, pensa.

talvez algum capricho maior desejado

porém negado por razão qualquer.

 

Mas será que isso se tornou perigoso

a ponto de interferir

na caminhada da vida adulta

ou apenas foi algo momentâneo

e que se desfez

com o passar do tempo

e o crescimento rápido e presente

mudando e modificando

corpo, mente, pensamentos e desejos?

Retrocede mais um pouco

e se vê agachado, espremido e sufocado

como se algo lhe apertasse os sentidos.

 

É tão pequeno

que mal consegue se enxergar

tal o volume de água

que lhe cobre todo o corpo.

Deseja chorar

pois no sufoco

quer gritar e quer sair

quer viver para o mundo

quer crescer e chorar.

 

Novamente o choro.

Por quê?

Se tantos riem

se alegram

e respiram felicidades?

 

Se tantos caminham

engatinham e pulam

de tanta alegria

que transpiram de seus poros?

 

Sente um impulso forte

a lhe empurrar para a frente

na direção do menino do quadro

que agora demonstra espanto

pela brusca mudança

em suas feições.

 

“Engraçado”

não demonstra mais tristeza

nem sentimentos guardados

parece olhar o futuro

e mostrar o quanto mudou

e quantas modificações se operaram

desde que abrira corrida

no tempo de sua vida.

O ancião continua sentado, impassível.

 

Semblante incerto

pois apenas tenta acreditar

nas certezas que o aguardam ansiosas.

 

Passa o olhar pelo quarto

e novamente o brilho ofuscante do azul

desperta em si

o desejo de ficar

de permanecer ali para todo o sempre

pois não mais temeria sofrimento e angústias

de um longínquo passado.

 

Passa o dedo pela moldura afora

como se acariciasse seu próprio rosto

num gesto carinhoso

de uma lembrança feliz.

 

“Fui feliz”

Como era gostoso

correr pelos campos verdejantes

atrás de pássaros e borboletas

que serpenteavam pelas flores primaveris.

 

Meu primeiro encontro com a escola

minhas bolinhas de gude

meu pião corriqueiro

e a peteca sapeca

pulando feito cabrita

de um lado ao outro.

 

Belos tempos

belas lembranças

me trazem de volta

o gosto pelas coisas simples e singelas

onde caminhar na chuva

fazia o coração pular descompassado

como se fora a grande aventura da época.

Meus dedos continuam a percorrer o quadro

agora encharcado de lágrimas

que jorram aos borbotões

pelos momentos que acabara de relembrar.

 

Jogo a tristeza de lado

e me deixo embalar

no embalo da saudade.

 

Meus olhos pouco veem

e nem quero mesmo enxergar

vivo um tempo que jamais retornará.

 

Algo me faz voltar

apaga-se a luz da saudade

para deixar penetrar

a chama da realidade.

 

Volto no tempo presente

e vejo no ancião

pequenos traços

que teimam em modificar-lhe

o semblante.

 

Seu olhar já não é vago

e de seus lábios brota algo

semelhante a um sorriso.

 

Sente-se forte, potente

vencedor de lutas difíceis

e batalhas quase intransponíveis

de uma vida longa

que lhe mostrou

que ainda o melhor

é acreditar sempre

e jamais esmorecer.

 

O homem achega-se a ele

deposita em seu rosto

um beijo molhado

de lágrimas quase

esquecidas pelo tempo.

 

Sorri.

Um sorriso sincero,

agradecido e feliz

 

Caminha em direção a porta

olha o quarto pela última vez

despede-se com um aceno

daquele que outrora foi

um retrato na parede de um quarto

e que representou toda uma vida

e que agora descansa

num quarto de azul esperança

cercado de todas as glórias

que conquistou quando aqui vivia.

 

 

JC BRIDON

 

 

 

 

 

 

JC Bridon
Enviado por JC Bridon em 22/06/2023
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